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Princípios Básicos do Comunismo

Atualizado: 25 de nov. de 2022

Friedrich Engels



“Princípios Básicos do Comunismo” é um projeto de programa da Liga dos Comunistas escrito por Friedrich Engels, em Paris, por decisão do Comitê Regional da Liga. Considerando-o como um projeto prévio. Em “Princípios Básicos do Comunismo”, Engels fundamentou teoricamente alguns dos princípios táticos e programáticos do partido proletário e apontou as medidas com as quais o proletariado, depois de ter conquistado o poder, prepararia a passagem do capitalismo ao socialismo.

No 2º Congresso da Liga dos Comunistas (29 de novembro a 8 de dezembro de 1847), as opiniões de Marx e Engels foram inteiramente aprovadas. Ambos foram encarregados de elaborar o programa da Liga, que viria a se chamar de Manifesto do Partido Comunista. Na redação do Manifesto, os fundadores do marxismo utilizaram uma série de teses expostas nos “Princípios Básicos do Comunismo”.

 

O que é o comunismo? O comunismo é a doutrina das condições de libertação do proletariado. O que é o proletariado? O proletariado é a classe da sociedade que tira o seu sustento única e somente da venda do seu trabalho e não do lucro de qualquer capital. É a classe cujo bem e cujo sofrimento, cuja vida e cuja morte, cuja total existência dependem da procura do trabalho e, portanto, da alternância dos bons e dos maus tempos para o negócio, das flutuações de uma concorrência desenfreada. Numa palavra, o proletariado ou a classe dos proletários é a classe trabalhadora do século 19. Portanto, nem sempre houve proletários? Não. Classes pobres e trabalhadoras sempre houve; e as classes trabalhadoras eram, na maioria dos casos, pobres. Mas nem sempre houve estes pobres, estes operários vivendo nas condições que acabamos de assinalar, portanto, nem sempre houve proletários, do mesmo modo que a concorrência nem sempre foi livre e desenfreada. Como é que apareceu o proletariado? O proletariado apareceu com a revolução industrial, que se processou na Inglaterra na segunda metade do século passado (século 18) e que, desde então, se repetiu em todos os países civilizados do mundo. Esta revolução industrial foi ocasionada pela invenção da máquina a vapor, das várias máquinas de fiar, do tear mecânico e de toda uma série de outros aparelhos mecânicos. Estas máquinas, que eram muito caras e, portanto, só podiam ser adquiridas pelos grandes capitalistas, transformaram todo o modo de produção anterior e suplantaram os antigos operários, na medida em que as máquinas forneciam mercadorias mais baratas e melhores do que as que os operários podiam produzir com as suas rodas de fiar e teares imperfeitos.

Estas máquinas colocaram, assim, a indústria totalmente nas mãos dos grandes capitalistas e tornaram a escassa propriedade dos operários (ferramentas, teares, etc.) completamente sem valor, de tal modo que, em breve, os capitalistas tomaram tudo nas suas mãos e os operários ficaram sem nada. Assim se instaurou na confecção de tecidos o sistema fabril.

Uma vez dado o impulso para a introdução da maquinaria e do sistema fabril, este sistema foi também muito rapidamente aplicado a todos os restantes ramos da indústria, nomeadamente, à estampagem de tecido e à impressão de livros, à olaria e à indústria metalúrgica. O trabalho foi cada vez mais dividido entre cada um dos operários, de tal modo que o operário que anteriormente fazia toda uma peça de trabalho agora passou a fazer apenas uma parte dessa peça. Esta divisão do trabalho tornou possível que os produtos fossem fornecidos mais depressa e, portanto, mais baratos. Ela reduziu a atividade de cada operário a um gesto mecânico muito simples, repetido mecanicamente a cada instante, o qual podia ser feito por uma máquina não apenas tão bem, mas ainda muito melhor. Deste modo, todos estes ramos da indústria caíram, um após outro, sob o domínio da força do vapor, da maquinaria e do sistema fabril, da mesma maneira que a fiação e a tecelagem.

Mas por este fato elas caíram, ao mesmo tempo, completamente nas mãos dos grandes capitalistas e aos operários foi assim retirado também o último resto de independência. Pouco a pouco, para além da própria manufatura, também o artesanato caiu cada vez mais sob o domínio do sistema fabril, uma vez que, aqui também, os grandes capitalistas suplantaram os pequenos mestres por meio da montagem de grandes oficinas, com as quais muitos custos eram poupados e o trabalho podia igualmente ser dividido.

Chegamos assim a que, nos países civilizados, quase todos os ramos de trabalho são explorados segundo o modelo fabril e, em quase todos os ramos de trabalho, o artesanato e a manufatura foram suplantados pela grande indústria. Por isso, a antiga classe média, em especial os pequenos mestres artesãos, fica cada vez mais arruinada, a anterior situação dos operários fica completamente transformada e constituem-se duas novas classes, que pouco a pouco absorvem todas as restantes, a saber:

1) a classe dos grandes capitalistas que, em todos os países civilizados, tem quase exclusivamente a posse de todos os meios de existência e das matérias-primas e dos instrumentos (máquinas, fábricas, etc.) necessários para a produção dos meios de existência. Esta é a classe dos burgueses, ou a burguesia;

2) a classe dos que nada possuem, e que, em virtude disso, estão obrigados a vender o seu trabalho aos burgueses a fim de obter em troca os meios de existência necessários ao seu sustento. Esta classe chama-se de classe dos proletários, ou proletariado. Em que condições tem lugar esta venda do trabalho dos proletários aos burgueses? O trabalho é uma mercadoria como qualquer outra, e daí que o seu preço seja determinado precisamente pelas mesmas leis que o de qualquer outra mercadoria. O preço de uma mercadoria, sob o domínio da grande indústria ou da livre concorrência – o que, como veremos, vem a dar ao mesmo –, é, porém, em média, sempre igual aos custos de produção dessa mercadoria. O preço do trabalho é, portanto, também igual aos custos de produção do trabalho. Os custos de produção do trabalho consistem, porém, precisamente, em tantos meios de existência quantos os que são necessários para manter os operários em condições de continuar a trabalhar e para não deixar extinguir-se a classe operária. O operário não obterá, portanto, pelo seu trabalho mais do que aquilo que é necessário para esse fim. O preço do trabalho, ou o salário, será, portanto, o mais baixo possível, o mínimo que é necessário para o sustento. Pelo fato de que, porém, os tempos ora são piores, ora são melhores para os negócios, o operário ora receberá mais, ora receberá menos, tal como o fabricante receberá ora mais, ora menos, pela sua mercadoria. Do mesmo modo, porém, que o fabricante, na média dos tempos bons e dos [tempos] maus para o negócio, não obtém pela sua mercadoria nem mais nem menos do que os seus custos de produção, também o operário, em média, não receberá nem mais nem menos do que aquele mesmo mínimo. Esta lei econômica do salário se realizará tanto mais rigorosamente quanto mais a grande indústria se for apoderando de todos os ramos do trabalho. Que classes de trabalhadores houve antes da revolução industrial? Conforme as diversas etapas de desenvolvimento da sociedade, as classes trabalhadoras viveram em condições diversas e tiveram posições diversas relativamente às classes proprietárias e dominantes. Na Antiguidade, os trabalhadores eram escravos dos proprietários, como ainda o são em muitos países atrasados e, inclusive, na parte sul dos Estados Unidos. Na Idade Média eram servos dos nobres proprietários de terras, como ainda o são na Hungria, na Polônia e na Rússia. Na Idade Média, até à revolução industrial, houve ainda, além disso, nas cidades, oficiais artesãos que trabalhavam a serviço de mestres pequeno-burgueses e, pouco a pouco, com o desenvolvimento da manufatura, apareceram os operários das manufaturas que eram já empregados por grandes capitalistas.

Como se diferencia o proletário do escravo? O escravo é vendido de uma vez para sempre; o proletário tem de vender a si próprio diariamente e hora a hora. O indivíduo escravo, propriedade de um senhor, tem uma existência assegurada, por muito miserável que seja, em virtude do interesse do senhor. Já o indivíduo proletário – propriedade, por assim dizer, de toda a classe burguesa –, a quem o trabalho só é comprado quando alguém dele precisa, não tem a existência assegurada. Esta existência está apenas assegurada a toda a classe dos proletários. O escravo está fora da concorrência, enquanto o proletário está dentro dela e sente todas as suas flutuações. O escravo vale como uma coisa, não como um membro da sociedade civil; o proletário é reconhecido como pessoa, como membro da sociedade civil. O escravo pode, portanto, levar uma existência melhor do que a do proletário, mas o proletário pertence a uma etapa superior do desenvolvimento da sociedade e está ele próprio numa etapa superior à do escravo. O escravo liberta-se ao abolir, de entre todas as relações de propriedade privada, apenas a relação de escravatura, tornando-se, assim, ele próprio proletário; o proletário só pode libertar-se ao abolir a propriedade privada em geral. Como se diferencia o proletário do servo? O servo tem a posse e o usufruto de um instrumento de produção, de uma porção de terra, e em troca entrega uma parte do produto, ou presta trabalho. O proletário trabalha com instrumentos de produção de um terceiro por conta desse terceiro, e em troca recebe uma parte do produto. O servo entrega, o proletário recebe. O servo tem uma existência assegurada, o proletário não a tem. O servo está fora da concorrência, o proletário está dentro dela. O servo liberta-se fugindo para as cidades e tornando-se aí artesão, ou dando ao seu amo dinheiro, em vez de trabalho e produtos, tornando-se rendeiro livre, ou expulsando o senhor feudal e tornando-se ele próprio proprietário: em suma, entrando, de uma ou de outra maneira, na classe proprietária e na concorrência. Já o proletário liberta-se abolindo a concorrência, a propriedade privada e todas as diferenças de classes.

Como se diferencia o proletário do artesão? Para a resposta que falta, Engels deixou em branco meia página do manuscrito. Como se diferencia o proletário do operário manufatureiro? O operário manufatureiro dos séculos 16 a 18 ainda tinha quase sempre na sua posse um instrumento de produção: o seu tear, as rodas de fiar para a família, um pequeno terreno que cultivava nas horas vagas. O proletário não tem nada disso. O operário manufatureiro vive quase sempre no campo e em relações mais ou menos patriarcais com o seu amo ou patrão. O proletário vive, na maioria dos casos, em grandes cidades e está numa pura relação de dinheiro com o seu patrão. O operário manufatureiro é arrancado das suas relações patriarcais pela grande indústria, perde a propriedade que ainda possuía e só então se torna ele próprio proletário. Quais foram as consequências imediatas da revolução industrial e da divisão da sociedade em burgueses e proletários? Em primeiro lugar, em todos os países do mundo, o velho sistema da manufatura ou da indústria baseada no trabalho manual foi completamente destruído pelo fato de os preços dos artigos industriais se tornarem cada vez mais baratos em consequência do trabalho das máquinas. Todos os países semibárbaros, os quais, até então, tinham permanecido mais ou menos alheios ao desenvolvimento histórico, e cuja indústria, até então, baseava-se na manufatura, foram, desta forma, violentamente arrancados de seu isolamento. Compraram as mercadorias mais baratas dos ingleses e deixaram arruinar os seus próprios operários manufatureiros. Assim, países que há milênios não faziam qualquer progresso, como por exemplo a Índia, foram revolucionados de uma ponta a outra, e a própria China caminha agora para uma revolução. As coisas chegaram a tal ponto que uma nova máquina hoje inventada na Inglaterra deixa sem pão, no espaço de um ano, milhões de operários na China. Deste modo, a grande indústria colocou em relação uns com os outros todos os povos da Terra, juntou todos os pequenos mercados locais no mercado mundial, preparou por toda a parte o terreno para a civilização e o progresso, de modo que tudo aquilo que acontece nos países civilizados tem de repercutir em todos os outros países. De tal modo, que se agora na Inglaterra ou na França, os operários se libertarem, isso terá de arrastar consigo revoluções em todos os países, as quais, mais tarde ou mais cedo, conduzirão igualmente à libertação dos operários locais. Em segundo lugar, em toda a parte em que a grande indústria substituiu a manufatura, a burguesia desenvolveu, no mais alto grau, a sua riqueza e o seu poder, e tornou-se a primeira classe do país. A consequência disto foi que, em toda a parte onde isso aconteceu, a burguesia tomou nas suas mãos o poder político e desalojou as classes até então dominantes: a aristocracia, os burgueses das corporações e a monarquia absoluta que representava a ambos. A burguesia aniquilou o poder da aristocracia, da nobreza, ao abolir os morgadios ou a inalienabilidade da propriedade fundiária e todos os privilégios da nobreza. Destruiu o poder dos burgueses das corporações, ao abolir as corporações e os privilégios dos artesãos. A ambos substituiu pela livre concorrência, isto é, o estado da sociedade em que cada um tem o direito de explorar qualquer ramo da indústria e em que nada o pode impedir da exploração do mesmo a não ser a falta do capital para tanto necessário. A introdução da livre concorrência é, portanto, a declaração pública de que, daí em diante, os membros da sociedade são apenas desiguais na medida em que os seus capitais são desiguais, de que o capital se tornou o poder decisivo e [de que], com isso, os capitalistas, os burgueses [se tornaram] a primeira classe da sociedade. A livre concorrência é, porém, necessária para o começo da grande indústria porque é o único estado da sociedade em que a grande indústria pode crescer. A burguesia, depois de ter aniquilado por esta forma o poder social da nobreza e dos burgueses das corporações, aniquilou lhes também o poder político. Assim como na sociedade se elevou à primeira classe, proclamou-se também como primeira classe politicamente. Fez isso com a introdução do sistema representativo, que se baseia na igualdade burguesa perante a lei, no reconhecimento legal da livre concorrência, e que nos países europeus foi instaurado sob a forma da monarquia constitucional. Nestas monarquias constitucionais são apenas eleitores aqueles que possuem um certo capital, ou seja, apenas os burgueses elegem os deputados, e estes deputados burgueses, por meio do direito de recusar impostos, elegem um governo burguês. Em terceiro lugar, ela [a revolução industrial] desenvolveu por toda a parte o proletariado na mesma medida em que desenvolveu a burguesia. Na proporção em que os burgueses se tornavam mais ricos, tornavam-se os proletários mais numerosos. Uma vez que os proletários somente por meio do capital podem ter emprego – e o capital só se multiplica quando emprega trabalho –, a multiplicação do proletariado avança precisamente ao mesmo passo que a multiplicação do capital. Ao mesmo tempo, concentra tanto os burgueses como os proletários em grandes cidades, nas quais se torna mais vantajoso explorar a indústria, e com esta concentração de grandes massas num mesmo lugar dá ao proletariado a consciência da sua força. Além disso, quanto mais [a revolução industrial] se desenvolve, quanto mais se inventam novas máquinas que suplantam o trabalho manual, tanto mais, como já dissemos, a grande indústria reduz os salários ao seu mínimo e torna, por esse fato, a situação do proletariado cada vez mais insuportável. Deste modo, ela prepara, por um lado, com o descontentamento crescente e, por outro lado, com o poder crescente do proletariado, uma revolução da sociedade pelo proletariado. Que outras consequências teve a revolução industrial? A grande indústria criou, com a máquina a vapor e as outras máquinas, os meios para multiplicar até ao infinito a produção industrial num tempo curto e com poucos custos. Sendo a produção tão fácil, a livre concorrência necessariamente decorrente desta grande indústria muito depressa assumiu um caráter extremamente intenso. Um grande número de capitalistas lançou-se na indústria e, rapidamente, produzia-se mais do que podia ser consumido. A consequência disso foi que as mercadorias fabricadas não podiam ser vendidas e sobreveio uma chamada crise comercial. As fábricas tiveram de ficar paradas, os fabricantes caíram na bancarrota e os operários ficaram sem pão. Por toda a parte sobreveio a maior miséria.

Depois de algum tempo foram-se vendendo os produtos em excesso, as fábricas voltaram a trabalhar, o salário subiu e, pouco a pouco, os negócios passaram a ir melhor do que nunca. Mas não por muito tempo, já que de novo voltaram a produzir-se mercadorias em excesso e sobreveio uma nova crise, que seguiu precisamente o mesmo curso que a anterior.

Assim, desde o começo deste século, a situação da indústria tem oscilado continuamente entre épocas de prosperidade e épocas de crise, e quase regularmente, de cinco em cinco anos, ou de sete em sete anos, sobreveio uma destas crises, de todas as vezes conjugada com a maior miséria dos operários, com uma agitação revolucionária geral e com o maior perigo para toda a ordem vigente. Quais as consequências destas crises comerciais que se repetem regularmente? Em primeiro lugar, a grande indústria, apesar de na sua primeira época de desenvolvimento ter ela própria dado origem à livre concorrência, está agora, contudo, a abandonar a livre concorrência. A concorrência e, em geral, a exploração da produção industrial por particulares se tomou para a grande indústria um grilhão que tem de quebrar e quebrará. A grande indústria, enquanto for empreendida na base atual, somente se pode manter por meio de uma perturbação geral repetida de sete em sete anos, a qual ameaça, a cada vez, toda a civilização, e não só faz cair os proletários na miséria como também arruína um grande número de burgueses. Portanto, ou a própria grande indústria tem de ser completamente abandonada – o que é uma absoluta impossibilidade –, ou então ela torna absolutamente necessária uma organização totalmente nova da sociedade, na qual já não são os fabricantes individuais, em concorrência entre si, mas toda a sociedade, de acordo com um plano estabelecido e segundo as necessidades de todos, quem dirige a produção industrial. Em segundo lugar, a grande indústria e a expansão da produção até ao infinito por ela tornada possível, possibilitam um estado da sociedade em que é produzido tudo o que é necessário à vida, de tal forma que cada membro da sociedade ficará por esse fato em condições de desenvolver e de pôr em prática todas as suas forças e aptidões em completa liberdade. De tal modo que precisamente aquela qualidade da grande indústria que dá origem, na sociedade de hoje, a toda a miséria e a todas as crises comerciais, é a mesma que, numa outra organização social, acabará com essa miséria e com essas oscilações que causam tanta infelicidade. Fica, assim, provado da maneira mais clara: 1) que todos estes males são consequências da ordem social que já não se adequa às condições existentes;

2) que já existem os meios para eliminar completamente estes males por meio de uma nova ordem social. De que tipo terá de ser esta nova ordem social? Antes do mais, ela tirará a exploração da indústria e de todos os ramos da produção em geral das mãos de cada um dos indivíduos particulares em concorrência uns com os outros e, em vez disso, terá de fazer explorar todos esses ramos da produção por toda a sociedade, isto é, por conta da comunidade, segundo um plano da comunidade e com a participação de todos os membros da sociedade. Abolirá, portanto, a concorrência e estabelecerá, em lugar dela, a associação. Uma vez que a exploração da indústria por particulares tinha como consequência necessária a propriedade privada, e que a concorrência não é mais do que o modo da exploração da indústria pelos proprietários privados individuais, a propriedade privada não pode ser separada da exploração individual da indústria nem da concorrência. A propriedade privada terá, portanto, igualmente de ser abolida e, em seu lugar, se estabelecerá a utilização comum de todos os instrumentos de produção e a repartição de todos os produtos segundo acordo comum, ou a chamada comunidade dos bens. A abolição da propriedade privada é a expressão mais breve e mais característica desta transformação de toda a ordem social necessariamente resultante do desenvolvimento da indústria e, por isso, é com razão levantada pelos comunistas como reivindicação principal. Então a abolição da propriedade privada não era possível anteriormente? Não. Todas as transformações da ordem social, todas as revoluções nas relações de propriedade, têm sido consequências necessárias da criação de novas forças produtivas que já não se adequavam às antigas relações de propriedade. Foi assim que a própria propriedade privada surgiu, porque a propriedade privada nem sempre existiu.

Quando, nos finais da Idade Média, foi criado na manufatura um novo tipo de produção que não se deixava subordinar à propriedade feudal e corporativa da época, é que esta manufatura, que já não cabia dentro das antigas relações de propriedade, deu, então, origem a uma nova forma de propriedade. Para a manufatura e para a primeira etapa do desenvolvimento da grande indústria não era possível, porém, qualquer outra forma de propriedade a não ser a propriedade privada. Enquanto não puder ser produzido tanto que seja não só suficiente para todos, mas que também fique um excedente de produtos para aumento do capital social e para a formação de mais forças produtivas, terá sempre de haver uma classe dominante, dispondo das forças produtivas da sociedade, e uma classe pobre e oprimida. A maneira como estas classes serão constituídas dependerá da etapa de desenvolvimento da produção. A Idade Média, dependente do cultivo da terra, deu-nos o barão e o servo; as cidades da baixa Idade Média mostraram-nos o mestre da corporação, o oficial e o jornaleiro; o século 17 tem o proprietário da manufatura e o operário manufatureiro; o século 19, o grande fabricante e o proletário. É claro que até aqui as forças produtivas não estavam ainda tão desenvolvidas ao ponto de se poder produzir o suficiente para todos e de a propriedade privada ter se tornado para essas forças produtivas um grilhão e um entrave. Hoje, porém, quando, pelo desenvolvimento da grande indústria se criaram, em primeiro lugar, capitais e forças produtivas numa quantidade nunca antes conhecida e existem meios para, num curto lapso de tempo, multiplicar essas forças produtivas até ao infinito; quando, em segundo lugar, essas forças produtivas estão concentradas nas mãos de poucos burgueses, enquanto a grande massa do povo se converte cada vez mais em proletários, enquanto a sua situação se torna mais miserável e insuportável, na mesma proporção em que se multiplicam as riquezas dos burgueses; quando, em terceiro lugar, estas forças produtivas poderosas e que se multiplicam facilmente ultrapassaram de tal maneira a propriedade privada e os burgueses que provocam a cada momento as mais violentas perturbações na ordem social – agora a abolição da propriedade privada não se tornou apenas possível, tornou-se inteiramente necessária. Será possível a abolição da propriedade privada por via pacífica? Seria de desejar que isso pudesse acontecer, e os comunistas seriam certamente os últimos que contra tal se insurgiriam. Os comunistas sabem muitíssimo bem que todas as conspirações são não apenas inúteis, como mesmo prejudiciais. Eles sabem muitíssimo bem que as revoluções não são feitas propositada nem arbitrariamente, mas que, em qualquer tempo e em qualquer lugar, elas foram a consequência necessária de circunstâncias inteiramente independentes da vontade e da direção deste ou daquele partido e de classes inteiras.

Mas eles também veem que o desenvolvimento do proletariado em quase todos os países civilizados é violentamente reprimido e que, deste modo, os adversários dos comunistas estão a contribuir com toda a força para uma revolução. Acabando assim o proletariado oprimido por ser empurrado para uma revolução, nós, os comunistas, defenderemos nos atos, tão bem como agora com as palavras, a causa dos proletários. Será possível abolir a propriedade privada de um só golpe? Não, do mesmo modo que não se podem fazer aumentar de um só golpe as forças produtivas já existentes tanto quanto são necessário para a edificação da comunidade [da sociedade comunista]. Por isso, a revolução do proletariado, que com toda a naturalidade se vai aproximando, só pouco a pouco poderá, portanto, transformar a sociedade atual, e somente poderá abolir a propriedade privada quando estiver criada a massa de meios de produção necessária para isso. Que curso de desenvolvimento tomará essa revolução? Ela estabelecerá, antes do mais, uma Constituição democrática do Estado, e com ela, direta ou indiretamente, o domínio político do proletariado. Diretamente, na Inglaterra, onde os proletários constituem já a maioria do povo. Indiretamente, na França e na Alemanha, onde a maioria do povo não consiste apenas em proletários mas também em pequenos camponeses e pequenos burgueses, os quais começam a estar envolvidos no processo de passagem ao proletariado, se tornam cada vez mais dependentes deste em todos os seus interesses políticos e, portanto, têm de se acomodar em breve às reivindicações do proletariado. Isto custará, talvez, uma segunda luta, a qual, porém, só pode terminar com a vitória do proletariado. A democracia seria totalmente inútil para o proletariado se ela não fosse utilizada imediatamente como meio para a obtenção de outras medidas que ataquem diretamente a propriedade privada e assegurem a existência do proletariado. As medidas principais, tal como decorrem, já agora, como consequência necessária, das condições existentes, são as seguintes:

1) Restrição da propriedade privada por meio de impostos progressivos, altos impostos sobre heranças, abolição da herança por parte das linhas colaterais (irmãos, sobrinhos, etc.), empréstimos forçados, etc.;

2) Expropriação gradual dos latifundiários, fabricantes, proprietários de caminhos-de-ferro e armadores de navios, em parte pela concorrência da indústria estatizada, em parte, diretamente, pela indenização em papéis do Estado; 3) Confisco dos bens de todos os emigrantes [latifundiários e capitalistas, em geral, fugidos para o estrangeiro, sabotando a economia] e rebeldes contra a maioria do povo;

4) Organização do trabalho ou ocupação dos proletários em propriedades nacionais, fábricas e oficinas, pela qual se elimina a concorrência dos operários entre si e os fabricantes são obrigados, enquanto ainda subsistirem, a pagar o mesmo salário elevado que o Estado;

5) Igual obrigação de trabalho para todos os membros da sociedade até à completa abolição da propriedade privada. Formação de exércitos industriais, sobretudo, para a agricultura;

6) Centralização do sistema de crédito e dos bancos nas mãos do Estado por meio de um banco nacional com capital do Estado e repressão de todos os bancos privados e banqueiros;

7) Multiplicação do número de fábricas, oficinas, caminhos-de-ferro e navios nacionais, cultivo de todas as terras e melhoramento das já cultivadas, na mesma proporção em que se multiplicarem os capitais e os operários que se encontram à disposição da nação;

8) Educação de todas as crianças, a partir do momento em que podem passar sem os cuidados maternos, em estabelecimentos nacionais e bancados pelo o Estado. Combinar a educação e o trabalho fabril;

9) Construção de grandes palácios nas propriedades nacionais para habitações coletivas das comunidades de cidadãos que se dedicam tanto à indústria como à agricultura, e que reúnam em si tanto as vantagens da vida citadina como as da rural, sem partilhar da unilateralidade e dos defeitos de ambos os modos de vida;

10) Destruição de todas as habitações e bairros insalubres e mal construídos;

11) Igualdade de direito de herança para os filhos ilegítimos e legítimos;

12) Concentração de todo o sistema de transportes nas mãos da nação. Naturalmente, nem todas estas medidas podem ser empreendidas de uma só vez. Porém, uma arrasta sempre atrás de si a outra. Uma vez realizado o primeiro ataque radical contra a propriedade privada, o proletariado se verá obrigado a seguir sempre adiante, a concentrar cada vez mais nas mãos do Estado todo o capital, toda a agricultura, toda a indústria, todo o transporte, toda a troca. É para aí que todas estas medidas apontam, e elas se tornarão aplicáveis e desenvolverão as suas consequências centralizadoras na precisa medida em que as forças produtivas do país sejam multiplicadas pelo trabalho do proletariado.

Finalmente, quando todo o capital, toda a produção e toda a troca estiverem concentrados nas mãos da nação, a propriedade privada desaparecerá por si própria, o dinheiro se tornará supérfluo e a produção aumentará tanto e os homens se transformarão tanto, que poderão igualmente tombar as últimas formas de intercâmbio da antiga sociedade. Poderá esta revolução realizar-se apenas num único país? Não. A grande indústria, pelo fato de ter criado o mercado mundial, levou todos os povos da terra – e, nomeadamente, os civilizados – a uma tal ligação uns com os outros que cada povo está dependente daquilo que acontece a outro. Além disso, em todos os países civilizados ela igualou de tal maneira o desenvolvimento social, que em todos esses países a burguesia e o proletariado se tornaram as duas classes decisivas da sociedade e a luta entre elas a luta principal dos nossos dias. A revolução comunista não será, portanto, uma revolução simplesmente nacional; será uma revolução que se realizará simultaneamente em todos os países civilizados, isto é, pelo menos na Inglaterra, nos Estados Unidos da América, na França e na Alemanha[1]. Ela se desenvolverá em cada um destes países mais rápida ou mais lentamente, consoante um ou outro país possuir uma indústria mais avançada, uma maior riqueza, uma massa mais significativa de forças produtivas. Na Alemanha ela será efetuada, portanto, mais lenta e dificilmente, enquanto que na Inglaterra mais rápida e facilmente. Ela terá igualmente uma repercussão significativa nos restantes países do mundo, transformará totalmente e acelerará muito o seu atual modo de desenvolvimento. Ela é uma revolução universal e terá, portanto, também um âmbito universal. Quais são as consequências da abolição final da propriedade privada? Pelo fato de a sociedade retirar das mãos dos capitalistas privados o usufruto de todas as forças produtivas e meios de comunicação, assim como a troca e a repartição dos produtos, e os administrar segundo um plano resultante dos meios disponíveis e das necessidades de toda a sociedade, serão eliminadas, antes do mais, todas as consequências nefastas que agora ainda se encontram ligadas à exploração da grande indústria. As crises desaparecerão; a produção alargada que para a ordem atual da sociedade é uma sobreprodução e uma causa tão poderosa da miséria, já não será então suficiente e terá de ser alargada ainda muito mais. Em vez de ocasionar a miséria, a sobreprodução assegurará, para além das necessidades imediatas da sociedade, a satisfação das necessidades de todos, criará novas necessidades e, ao mesmo tempo, os meios para as satisfazer. Ela será condição e motivo de novos progressos, e realizará estes progressos sem que, por esse fato, como sempre aconteceu até aqui, a ordem social seja perturbada. A grande indústria, liberta da pressão da propriedade privada, se desenvolverá numa tal extensão que, comparado com ela, o seu atual desenvolvimento parecerá tão pequeno como o da manufatura comparada com a grande indústria dos nossos dias. Este desenvolvimento da indústria colocará à disposição da sociedade uma massa suficiente de produtos para satisfazer as necessidades de todos. Do mesmo modo, a agricultura, que também em virtude da pressão da propriedade privada e do parcelamento tem sido impedida de apropriar os aperfeiçoamentos e os desenvolvimentos científicos já realizados, viverá um ascenso totalmente novo e colocará à disposição da sociedade uma quantidade plenamente suficiente de produtos. Desta maneira, a sociedade produzirá produtos bastantes para poder organizar de tal modo a repartição que as necessidades de todos os membros sejam satisfeitas. A separação da sociedade em diversas classes opostas umas às outras se tornará, assim, supérflua. Ela não se tornará, porém, apenas supérflua; será mesmo incompatível com a nova ordem social. A existência de classes é resultado da divisão do trabalho, e a divisão do trabalho, no seu modo atual, desaparecerá totalmente. É que para trazer a produção industrial e agrícola até o nível descrito, não bastam apenas os meios auxiliares mecânicos e químicos; as capacidades dos homens que põem em movimento esses meios auxiliares têm igualmente de ser desenvolvidas em medida correspondente. Assim como os camponeses e os operários manufatureiros do século passado transformaram todo o seu modo de vida e se tornaram eles próprios homens completamente diferentes quando foram incorporados na grande indústria, do mesmo modo também a exploração comum da produção por toda a sociedade e o novo desenvolvimento da produção dela decorrente necessitarão de – e também criarão – homens completamente diferentes. A exploração comum da produção não pode ser levada a cabo por homens como os de hoje, que estão subordinados, acorrentados, a um único ramo da produção, que são por ele explorados; homens que desenvolveram apenas uma das suas aptidões em detrimento de todas as outras, que conhecem apenas um ramo ou apenas um ramo de um ramo da produção total. A indústria atual já precisa cada vez menos destes homens. A indústria explorada em comum, e em conformidade com um plano, por toda a sociedade pressupõe inteiramente homens cujas aptidões estejam integralmente desenvolvidas e que estejam em condições de abarcar todo o sistema da produção. A divisão do trabalho, minada já hoje pelas máquinas, que faz de um camponês, do outro sapateiro, do terceiro operário fabril, do quarto especulador da bolsa, desaparecerá, portanto, totalmente. A educação permitirá aos jovens passar rapidamente por todo o sistema de produção, colocando-os em condições de passar sucessivamente de um ramo de produção para outro, conforme o proporcionem as necessidades da sociedade ou as suas próprias inclinações. Se retirará deles, portanto, o caráter unilateral que a atual divisão do trabalho impõe a cada um. Deste modo, a sociedade organizada numa base comunista dará aos seus membros oportunidade de porem em ação, integralmente, as suas aptidões integralmente desenvolvidas. Com isso, desaparecerão também necessariamente as diversas classes. De tal maneira que, por um lado, a sociedade organizada numa base comunista é incompatível com a existência de classes e, por outro lado, a edificação dessa sociedade fornece ela própria os meios para suprimir essas diferenças de classes. Decorre daqui, por conseguinte, que a oposição entre cidade e campo desaparecerá igualmente. A exploração da agricultura e da indústria pelos mesmos homens, em vez de por duas classes diferentes, é já, por causas totalmente materiais, uma condição necessária da associação comunista. A dispersão da população rural pelo campo, a par da concentração da população industrial nas grandes cidades, é uma situação que apenas corresponde a um estágio ainda não desenvolvido da agricultura e da indústria, um impedimento já hoje muito sensível para todo o desenvolvimento ulterior. A associação geral de todos os membros da sociedade para a exploração comum e planificada das forças de produção, a expansão da produção num grau tal que satisfaça as necessidades de todos, a liquidação da situação em que as necessidades de uns são satisfeitas à custa dos outros, a aniquilação total das classes e dos seus antagonismos, o desenvolvimento integral das capacidades de todos os membros da sociedade por meio da eliminação da divisão do trabalho até agora vigente, por meio da educação industrial, por meio da troca de atividades, por meio da participação de todos nos prazeres criados por todos, por meio da fusão da cidade e do campo – eis os resultados principais da abolição da propriedade privada. Que influência exercerá a ordem social comunista sobre a família? Ela fará da relação de ambos os sexos uma pura relação privada, que diz respeito apenas às pessoas que nela participam e em que a sociedade não tem de imiscuir-se. Ela pode fazê-lo, uma vez que aboliu a propriedade privada e educa as crianças comunitariamente e, por este fato, anula as duas bases fundamentais do atual matrimônio: a dependência, por intermédio da propriedade privada, da mulher relativamente ao homem e dos filhos relativamente aos pais.

Aqui se encontra também a resposta à gritaria tão moralista dos filisteus contra a comunidade comunista das mulheres. A comunidade das mulheres é uma relação que pertence totalmente à sociedade burguesa e hoje em dia reside inteiramente na prostituição. A prostituição repousa, porém, sobre a propriedade privada, e cai com ela. Portanto, a organização comunista, em vez de introduzir a comunidade das mulheres, muito pelo contrário, suprime-a. Qual será a atitude da organização comunista face às nacionalidades existentes? Fica[2]

Qual será a sua atitude face às religiões existentes? Fica

Como se diferenciam os comunistas dos socialistas? Os chamados socialistas dividem-se em três grupos. O primeiro grupo consiste nos partidários da sociedade feudal e patriarcal que foi aniquilada, e que continua ainda a ser diariamente aniquilada pela grande indústria, pelo comércio mundial e pela sociedade burguesa por ambos criada. Este grupo tira dos males da sociedade atual a conclusão de que a sociedade feudal e patriarcal teria de ser restabelecida, porque estava livre destes males. Todas as suas propostas se dirigem, por caminhos direitos ou tortuosos, para este objetivo. Este grupo de socialistas reacionários, apesar da sua pretensa compaixão e das suas lágrimas ardentes pela miséria do proletariado, será, todavia, contínua e energicamente combatido pelos comunistas, porque:

1) se esforça por atingir algo de puramente impossível; 2) procura restabelecer o domínio da aristocracia, dos mestres das corporações e dos proprietários de manufaturas, com o seu cortejo de reis absolutos ou feudais, de funcionários, de soldados e de padres, uma sociedade que, por certo, estava livre dos males da sociedade atual, mas que, em contrapartida, trazia consigo, pelo menos, outros tantos males e não oferecia a perspectiva de libertação dos operários oprimidos por meio de uma organização comunista;

3) ele mostra os seus verdadeiros objetivos quando o proletariado se torna revolucionário e comunista, aliando-se então imediatamente com a burguesia contra os proletários.

O segundo grupo consiste nos partidários da sociedade atual aos quais os males dela necessariamente decorrentes provocaram apreensões quanto à subsistência desta sociedade. Eles procuram, por conseguinte, conservar a sociedade atual, mas eliminar os males que a ela estão ligados. Com este objetivo, propõem, uns, simples medidas de beneficência, outros, grandiosos sistemas de reformas que, sob o pretexto de reorganizarem a sociedade, querem conservar as bases da sociedade atual e, com elas, a sociedade atual. Estes socialistas burgueses terão igualmente de ser combatidos constantemente pelos comunistas, uma vez que eles trabalham para os inimigos dos comunistas e defendem a sociedade que os comunistas querem precisamente derrubar.

O terceiro grupo consiste, finalmente, nos socialistas democráticos que, pela mesma via que os comunistas, querem uma parte das medidas indicadas na pergunta 18ª, porém, não como meio de transição para o comunismo, mas como medidas que são suficientes para abolir a miséria e fazer desaparecer os males da sociedade atual. Estes socialistas democráticos ou são proletários que ainda não estão suficientemente esclarecidos acerca das condições da libertação da sua classe, ou são representantes dos pequenos burgueses, uma classe que até à conquista da democracia e das medidas socialistas dela decorrentes sob muitos aspectos tem os mesmos interesses que os proletários. Por isso, os comunistas se entenderão, nos momentos de ação, com esses socialistas democráticos e em geral terão de seguir com eles, de momento, uma política o mais possível comum, desde que esses socialistas não se ponham a serviço da burguesia dominante e não ataquem os comunistas. É claro que este modo de ação comum não exclui a discussão das divergências com eles. Qual a atitude dos comunistas face aos restantes partidos políticos do nosso tempo? Esta atitude é diversa nos diversos países. Na Inglaterra, na França e na Bélgica, onde a burguesia domina, os comunistas têm, por enquanto, um interesse comum com os diversos partidos democráticos e, na realidade, um interesse tanto maior quanto mais os democratas se aproximam do objetivo dos comunistas com as medidas socialistas agora por toda a parte por eles defendidas, isto é, quanto mais clara e determinantemente eles defendem os interesses do proletariado e quanto mais se apoiam no proletariado. Na Inglaterra, por exemplo, os cartistas [participantes do movimento operário da Grã-Bretanha entre os anos 30 e meados dos 50 do século 19], integrados por operários, estão infinitamente mais próximos dos comunistas do que os pequenos burgueses democráticos ou os chamados radicais.

Na América, onde foi introduzida a constituição democrática, os comunistas têm de apoiar o partido que quer voltar essa constituição contra a burguesia e utilizá-la no interesse do proletariado, isto é, os reformadores agrários nacionais. Na Suíça, os radicais, apesar de serem eles próprios ainda um partido muito heterogêneo, são, todavia, os únicos com os quais os comunistas se podem entender, e entre estes radicais os mais progressistas são, por sua vez, os valdenses e os de Genebra. Na Alemanha, finalmente, só agora está iminente a luta decisiva entre a burguesia e a monarquia absoluta. Como, porém, os comunistas não podem contar com uma luta decisiva entre eles próprios e a burguesia antes de que a burguesia domine, o interesse dos comunistas é ajudar a levar os burgueses ao poder tão depressa quanto o possível, para, por sua vez, os derrubar o mais depressa possível. Os comunistas têm, portanto, de continuamente tomar partido pelos burgueses liberais face os governos e apenas de se precaver de partilhar as ilusões dos burgueses ou de dar crédito às suas afirmações sedutoras sobre as consequências benéficas da vitória da burguesia para o proletariado. As únicas vantagens que a vitória da burguesia trará aos comunistas consistirão:

1) em diversas concessões que facilitarão aos comunistas a defesa, discussão e propagação dos seus princípios e, com isso, a união do proletariado numa classe estreitamente coesa, preparada para a luta e organizada;

2) na certeza de que, no dia em que os governos absolutos caírem, chegará a hora da luta entre os burgueses e os proletários. Desse dia em diante, a política partidária dos comunistas será a mesma que naqueles países em que agora domina já a burguesia.


Fonte: marxist.blog



 

NOTAS

[1]. Esta conclusão de Engels sobre a possibilidade da vitória da revolução proletária simultaneamente nos países capitalistas avançados e, consequentemente, sobre a impossibilidade da vitória da revolução num só país, era justa para o período do capitalismo pré-monopolista. Lênin, partindo da lei por ele descoberta do desenvolvimento político e econômico desigual do capitalismo na época do imperialismo, chegou a uma nova conclusão: a da possibilidade da vitória da revolução socialista inicialmente em poucos ou num só país, individualmente considerado, e da impossibilidade da vitória simultânea da revolução em todos os países ou na maioria deles. A formulação desta nova conclusão surge pela primeira vez no trabalho de Lênin Sobre a Palavra de Ordem dos Estados Unidos da Europa, publicado em 1915.

[2]. No manuscrito, em vez da resposta à 22ª e 23ª perguntas, está a palavra “fica”. Aparentemente ela significa que a resposta deve manter a formulação que lhe foi dada num dos projetos prévios do programa da Liga dos Comunistas que não chegou até nós.


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